
13/05/2024
Foto: Andorinha-grande (Progne chalybea) / Crédito: Alexsander Antunes
Na última quarta-feira, dia 8 de maio, o Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA) ofereceu palestra “Aves Migratórias no estado de São Paulo”, ministrada pelo pesquisador científico Alexsander Antunes. A apresentação aconteceu em ambiente online teve 55 participantes.
O evento aconteceu em celebração ao Dia Mundial das Aves Migratórias, que é comemorado todos os anos em duas datas diferentes, escolhidas para coincidir com as épocas de migração da avifauna em cada hemisfério, quando elas estão viajando entre suas áreas de reprodução e suas áreas de invernada: no segundo sábado de maio e de outubro, que no Brasil coincidem com as migrações para o norte (no outono) e para o sul (na primavera). O objetivo é aumentar a conscientização sobre a importância da conservação das aves migratórias e de seus habitats ao redor do mundo.
A migração é um fenômeno de deslocamento amplamente distribuído no reino animal, incluindo a nossa espécie. Todos os seres humanos das Américas, por exemplo, descendem de correntes migratórias. No caso das aves, a migração ocorre em resposta a uma variação sazonal, como a busca por locais onde há disponibilidade de recursos alimentares, conforme a época do ano, ou o retorno ao seu local de reprodução (fidelidade ao sítio de origem), áreas que ofereçam condições ideais para o acasalamento, a nidificação e a criação dos filhotes. E não há apenas uma forma de navegação. Algumas espécies viajam durante o dia, outras durante a noite. Tem aquelas que voam sobre terra firme e evitam passar sobre o oceano, enquanto outras cruzam o continente americano passando por cima do mar do Caribe. Algumas tomam rotas distintas de ida e volta. E as aves se orientam de maneiras diferentes durante a migração: pela luz do sol ou das estrelas, pela correntes de ar quente, pelo campo magnético da Terra, por marcadores geográficos (rios, montanhas, costa marítima), pelo olfato, pela comunicação com outras aves e até mesmo pela memória.
Hábitos migratórios
Durante a palestra, Alexsander, que é ornitólogo (profissional que se dedica ao estudo das aves), apresentou uma classificação desse grupo de animais quanto aos hábitos migratórios, dando exemplos de espécies que ocorrem no território paulista. Existem as espécies residentes, que não migram, como a lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta) e o sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris), este último sendo a ave símbolo de São Paulo e do Brasil. Temos as nômades, que têm migração irregular e imprevisível, sem sazonalidade, a exemplo do pixoxó (Sporophila frontalis), que migra em busca de sementes de taquaras nativas para se alimentar. Há ainda os indivíduos vagantes e ocasionais, que por erros de rota podem parar em um lugar inesperado. O pesquisador do IPA alerta que embora esse tipo de episódio faça a alegria dos observadores de aves pelo avistamento de espécies inusitadas, os especialistas devem sempre avaliar essas informações com muito rigor e cuidado antes de determinar a ocorrência de nova espécie no local.
Há migrantes de curta e média distância, como o sabiá-una (Turdus flavipes) que ocorre na cidade de São Paulo e faz tanto deslocamentos tanto para a Serra do Mar quanto para a Região Sul do país. Temos também migrantes de longa distância, como o maçarico-branco (Calidris alba). Algumas aves fazem paradas durante a migração, seja para se alimentar ou descansar, seja para evitar condições climáticas extremas ou reavaliar as rotas. Outras são capazes de realizar migrações longas sem parar. Essas aves são conhecidas como migratórias non stop ou aves de voo contínuo. A recordista de em voo “sem escalas” é uma fêmea do fuselo (Limosa lapponica), que foi acompanhada por satélite e viajou 13.560 km em 11 dias. O feito foi registrado no Guinness Book, o livro dos recordes. Esta espécie não ocorre em São Paulo, no entanto pode ser avistada na Região Nordeste do Brasil. Já a migração mais longa conhecida é a do trita-réis ártico (Sterna paradisaea), que percorreu 81 mil quilômetros ao longo do ano.
Essas categorias de classificação não são definitivas. Há aves que abandonam a migração ou mudam de categoria, a exemplo do marrecão (Netta peposaca), que foi avistado pela primeira vez em São Paulo na década de 1970 e atualmente já se reproduz no estado, na Área de Proteção Ambiental Tanquã-Rio Piracicaba. O palestrante reforçou ainda que, para essas classificações, é importante que se pense na escala. “Uma espécie migratória em São Paulo, por exemplo, não necessariamente é migratória no Brasil ou em outro estado”, explica.
Protegendo a avifauna
O pesquisador do IPA afirma que São Paulo é um território privilegiado para a observação de aves migratórias, pois passam por aqui diversas rotas de espécies que cruzam desde o extremo sul até o extremo norte da América. “Essas aves nos mostram que o continente americano é um só. O que ocorre no norte afeta o sul e vice-versa. Quase todo o estado é importante para alguma espécie de ave migratória e praticamente todas as Unidades de Conservação paulistas estão dentro de suas rotas”, revela. Cerca de 850 espécies de aves ocorrem em São Paulo, sendo que 128 são migratórias.

Áreas de concentração de aves migratórias no estado de São Paulo
As aves migratórias desempenham papéis importantes em diversos ecossistemas e têm impactos significativos no meio ambiente. Muitas são polinizadoras. Outras contribuem para a dispersão de sementes. Algumas se alimentam de insetos, roedores e outras pragas agrícolas. Também desempenham um papel na ciclagem de nutrientes. Além disso, seu comportamento migratório pode servir como indicador da saúde dos ecossistemas. Assim, a conservação das aves migratórias muitas vezes implica na preservação de habitats naturais, o que beneficia não apenas as aves, mas também outras formas de vida que dependem desses ecossistemas.
Um exemplo interessante dado na palestra de como as aves migratórias movimentam o fluxo de energia entre os ecossistemas foi o caso da jararaca-ilhoa (Bothrops insularis), serpente que vive exclusivamente na Ilha da Queimada Grande, a 35 km do litoral paulista. Ela se alimenta de aves migratórias, já que as aves residentes a reconhecem.
As aves migratórias sofrem diversos tipos de impactos oriundos de caça, conflitos com seres humanos, poluição, mudanças climáticas, degradação e perda de habitat, prédios espelhados e parques eólicos. Ao longo do evento, o ornitólogo alertou para a importância de se proteger as aves migratórias, visto que essas espécies são mais ameaçadas de extinção do que as residentes, e apresentou as diferentes técnicas para estudo aves que subsidiam políticas de proteção dessas espécies, como o anilhamento, que é a mais tradicional, ou tecnologias como câmeras e gravadores autônomos, radares, geolocalizadores, satélites, nanotags, isótopos e marcadores genéticos de alta resolução. O pesquisador explicou que esse é um campo de pesquisa científica bastante dinâmico e com muitos avanços sendo desenvolvidos, inclusive com a participação de pessoas não especializadas, com destaque para os birdwatchers.
Divulgação Científica
Esta foi a sexta palestra de uma série que o IPA vem promovendo em datas comemorativas relacionadas às pautas científica e ambiental. No dia 1º de março, Alexsander já havia ministrado outra sobre a importância das Unidades de Conservação para a proteção da natureza, marcando o Dia Mundial da Vida Selvagem. Além disso, em 9 de maio, participou, junto à pesquisadora Andrea Pires, do segundo episódio do podcast “Conexão – Pesquisa Ambiental” batendo um papo sobre conservação da fauna no estado de São Paulo.
Assista à palestra no YouTube do IPA:
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