
18/10/2023
A pesquisadora científica Giselda Durigan, do Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA), em entrevista à assessoria de imprensa do Consórcio Cerrado das Águas, alerta que, para o Cerrado, práticas de restauração adotadas na Mata Atlântica podem levar a resultados prejudiciais e de baixa eficiência para manutenção dos serviços ecossistêmicos. Para isso, ela recomenda que se mantenha e recupere as diferentes fitofisionomias do bioma savânico.
Veja abaixo trecho retirado da reportagem:
Giselda afirma que no Cerrado as árvores devem ser coadjuvantes e não dominantes, isso porque o Cerrado tem uma estrutura caracterizada por árvores esparsas e um estrato rasteiro dominado por capins recobrindo o chão. Para ela, se o Cerrado se transformar em uma grande área florestal, com a chamada área de sucessão, há consequências negativas.
“Se o adensamento (florestal) acontecer no Cerrado, as consequências negativas para o bioma serão dramáticas em termos de perda de espécies endêmicas da flora e da fauna e, além disso, será severamente comprometido o principal serviço ecossistêmico associado à vegetação savânica, que é a recarga de reservas de água subterrânea e o abastecimento das nascentes e dos rios na maior parte do Brasil. Isso ocorreria porque florestas interceptam em suas copas cerca de 30% da chuva e retiram muito mais água do solo do que a vegetação aberta do Cerrado”, avalia a pesquisadora.
Conexão de paisagens: caminho eficaz para a restauração
O desmatamento no Cerrado acendeu, mais uma vez, o alerta vermelho no primeiro semestre de 2023. O total de alertas de desmate cresceu 21% neste período, o que equivale a 4.408 km², dados divulgados pelo Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter). Na contramão dos números alarmantes, há ações que visam ao reflorestamento adequado e trazem esperanças para a conservação desse importante bioma. Uma dessas ações é a conectividade de paisagens, unindo as áreas naturais remanescentes do Cerrado. Contudo, há desafios que precisam ser vencidos para que isto ocorra, como conta Giselda.
“A conectividade entre as áreas remanescentes depende do uso da terra que as separa. Quanto menos semelhante for a estrutura da vegetação cultivada à estrutura da vegetação de savana (plantas lenhosas esparsas sobre o estrato rasteiro graminoso), mais grave será o isolamento. A agricultura é a matriz mais hostil, ou seja, é a que mais fortemente isola os remanescentes do Cerrado. No outro extremo estão as pastagens que não foram intensificadas. Se entre os remanescentes existirem pastagens com árvores e arbustos esparsos, pode-se considerar que os fragmentos de Cerrado continuam conectados para a maior parte da fauna (aves, mamíferos, répteis, formigas e até invertebrados) e da flora. A fauna continua utilizando as pastagens como fonte de alimento e habitat, e as plantas nativas existentes nas pastagens funcionam como stepping-stones para agentes polinizadores e dispersores de sementes. A silvicultura é menos amigável do que as pastagens, mas é bem menos hostil do que a agricultura, especialmente por manter sub-bosque no Cerrado e por ser em intervalos de tempo bem mais longos”, analisa.
Para a pesquisadora, há possibilidades para se buscar uma paisagem mais amigável no Cerrado para minimizar as consequências da fragmentação e, para isso, ela faz duas recomendações principais: manter (ou restaurar) as faixas de preservação permanente com vegetação nativa e isso compreende não só mata ciliar, mas campos úmidos, veredas, e até uma parte de vegetação aberta de Cerrado; e conectar os fragmentos remanescentes entre si e com a zona ripária por corredores de pastagem ou de vegetação restaurada com estrutura de savana (árvores e arbustos esparsos e um estrato rasteiro predominantemente formado por gramíneas nativas).
Confira a matéria completa no site do Consórcio Cerrado das Águas.
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