27/02/2023

 

Avaliação de Processos de Restauração de ecossistemas eutrofizados busca associar mudanças nas comunidades de algas e cianobactérias perifíticas e planctônicas com as mudanças ambientais e climáticas na região do Cinturão Verde Paulista

Projeto desenvolvido por grupo de pesquisadores liderados pela Dra. Carla Ferragut, do Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA), tem como foco identificar a influência dos nutrientes e temperatura sobre as comunidades algais perifíticas e planctônicas, com o propósito de contribuir no desenvolvimento de propostas para restauração ecológica e redução do processo de eutrofização na região metropolitana de São Paulo.

A investigação dialoga com os demais módulos de pesquisa que integram o projeto “Desafios para Conservação da Biodiversidade frente a Mudanças Climáticas, Poluição e Uso e Ocupação do Solo” (Proc. FAPESP 2017/50341-0), na região do cinturão verde paulista, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e está estritamente ligada ao projeto desenvolvido pelo biólogo Dr. Eduardo Cabral Gomes, que estuda processos similares na ciclagem de nutrientes no solo.

Para entender os objetivos desta pesquisa é necessário compreender o que significa a eutrofização na dinâmica de lagos e reservatórios de água, como ocorre e quais impactos ela pode provocar em nosso cotidiano.

A eutrofização é uma resposta biológica à sobrecarga de nutrientes em corpos de água, especialmente o fósforo e o nitrogênio, e provém de ações antrópicas (aquelas realizadas pelo homem), como a ocupação desordenada de territórios, especialmente em áreas próximas dos corpos de água; o lançamento de esgoto, na maioria das vezes sem tratamento direto, em lagos, rios, riachos e reservatórios, incluindo os de abastecimento público; o lançamento de resíduos de produtos descartados de maneira irregular pelos setores produtivos (industrial e agrícola), intensificado pela lixiviação, que funciona como carreadora de fertilizantes depositados no solo; bem como o desmatamento e os poluentes existentes nas grandes cidades. A elevação das temperaturas nos ecossistemas em função do aquecimento global também pode intensificar o problema da eutrofização, como lembra a pesquisadora Dra. Carla Ferragut.

Embora pareça um processo “inofensivo”, nutrientes em excesso podem desequilibrar os ecossistemas, desencadeando o crescimento acelerado de vegetação indesejada ou incompatível ao habitat em que se encontra. O avanço descontrolado da eutrofização pode levar um ecossistema à morte, principalmente pela falta de oxigênio. A floração de algas e cianobactérias nas águas, especialmente em reservatórios e lagos; o mau odor que demanda o tratamento intensivo, nem sempre com os resultados desejados; a morte de peixes e demais conjuntos de espécies aquáticas são consequências da eutrofização.

Em nível biológico, a eutrofização provoca mudanças na produção primária e na composição de espécies de uma comunidade, implicando em alterações diretas sobre a cadeia alimentar e o fluxo energético.  Ao nível econômico, causa distúrbios na produção pesqueira e, em nível social, torna áreas de recreação e lazer impróprias para uso. Por fim, ao nível da saúde, torna a água dos grandes mananciais impróprias para consumo humano.

Restaurar é o caminho

Um dos grandes desafios globais é reverter o processo de eutrofização. Assim, entre os objetivos estabelecidos no projeto estão a implementação de técnicas e ferramentas capazes de minimizar o efeito causado pela entrada de nutrientes, que prejudicam a manutenção dos mananciais, possibilitando desta forma melhorar a qualidade da água que as pessoas consomem e da conservação dos ecossistemas aquáticos.

Carla Ferragut assinala que, o projeto de um de seus alunos de Doutorado realizado nas câmaras de crescimento avaliará se o aumento de temperatura afetará a capacidade da comunidade perifítica de atuar como biorreator natural para retenção de fósforo e consequente agente de “limpeza” nas águas. “A ideia de estabelecer dois cenários – atual e futuro – este último com o aumento provável de 5,7°C até o final do século 21 em nossa região geográfica, conforme relatório IPCC, é de extrema importância para aprimorar a compreensão sobre o processo de eutrofização nos ecossistemas simulando cenários futuros”, sintetiza.

Como as algas se reproduzem muito rapidamente, a partir da elevação de temperatura, será possível verificar quais modificações afetam a capacidade de biorremediação do perifíton, considerando diferentes condições de limitação por nutrientes, como ocorre naturalmente nos lagos e reservatórios. Para se ter ideia, nas florestas uma sucessão pode durar até cem anos, enquanto na comunidade perifítica esse prazo se reduz a trinta dias, tornando possível avaliar com eficácia e menor espaço de tempo os efeitos de elevação da temperatura sobre essa trajetória sucessional, que é o curso de substituição das espécies.

Ao mesmo tempo em que o projeto proporcionou descobertas importantes para a área acadêmica científica, Carla destaca que “a aprovação deste estudo trouxe para o Instituto vida nova, possibilitou o desenvolvimento de novos projetos e a formação de recursos humanos, que também irão disseminar conhecimento, o que é muito importante avanço científico”.

Em sua opinião, o país precisa de pessoas capacitadas para pensar a dinâmica de ecossistemas, especialmente, os aquáticos. “Certamente, nossas descobertas irão contribuir não só para a formulação de políticas públicas, mas para o entendimento do funcionamento dos ecossistemas aquáticos, como um todo, e também com a formação de especialistas, algo fundamental para o nosso país, que precisa de pessoas fazendo ciência séria e de qualidade”.